Amanda Baroni – 20\02\2024 – 18:45

Durante participação da Cúpula da União Africana, no último fim de semana, o chefe do executivo comparou o conflito em Gaza ao Holocausto, o que repercutiu de forma negativa nas redes sociais e no cenário político. Na segunda feira, (19\02), Israel rebateu a fala declarando Lula como “persona non grata”, alguém que não é bem vindo, numa tradução livre, e exigiu retratação do presidente, que se recusou.

Paulo Gabriel, Coordenador do Núcleo de Estudos do Oriente Médio da Universidade Federal Fluminense (UFF), diz que a busca do Brasil por mediar conflitos é antiga: “O país ambiciona integrar o Conselho de Segurança da ONU e interceder na guerra seria uma estratégia para destacar na geopolítica internacional, assim como os países considerados potências, como Estados Unidos, Rússia, França, Reino Unido e China.”  

Historicamente, as resoluções de conflitos do Oriente Médio são concentradas por essas nações, como afirma Danilo Porfírio, Professor de Relações Internacionais do Centro Universitário de Brasília (CEUB). “A Rússia, trata dos interesses árabes ou de países islâmicos e os Estados Unidos e Europa, de Israel. E este, que conta com apoio americano, rejeita a tentativa de mediação do Brasil.” 

Danilo conta ainda que no passado o Brasil viveu algo semelhante, durante o tratado nuclear no Irã, onde americanos e europeus simplesmente ignoraram o país. “Há uma diferença significativa entre as aspirações do Brasil e a realidade do mundo político.”

Além da dificuldade do Brasil em alcançar tal nível em sua política, a declaração do presidente prejudica ainda mais a possibilidade do país em promover ou participar de um diálogo para cessar o conflito. Para o professor, a postura de Lula evidencia uma busca de protagonismo do Brasil, porém desastrosa.” Expor sua sensibilização à causa palestina até gera simpatia, mas pode nos isolar [política e economicamente] pois nem todos os países se posicionaram sobre o tema”, explica.

Já a especialista política, Stephannie Lopes, do Rio de Janeiro, diz que faltou parcimônia na declaração e que foi uma forma de pressionar o governo israelense a recuar. “O Planalto vê esses atos como barbaridades contra os palestinos, porém seria melhor manter a boa convivência, mostrar que é a favor dos dois estados, a favor da defesa do povo palestino e não focar em ataques.”

Israel e Brasil mantém relações políticas e econômicas significativas e ambos colaboram em projetos de pesquisa e desenvolvimento, especialmente em agricultura irrigada e tecnologia da água, onde Israel é líder mundial, segundo Stephannie. A especialista conta que Israel é um forte fornecedor em tecnologia, agricultura, defesa e segurança. Já o Brasil, é exportador de soja, carne bovina e frango, mas o comentário do presidente “fragiliza essa relação.”

Em abril do ano passado, o presidente compartilhou críticas à dependência do dólar e neste último fim de semana mostrou novamente seu descontentamento com a concentração de monopólios políticos e econômicos das super potências, indicando que há um sentimento por encontrar maior autonomia.

Entre suas declarações, Lula sugeriu, por exemplo, a inserção de outros países no Conselho, inclusive a criação de um Estado Palestino. Paulo explica que uma representação mais plural na ONU é importante e que isso pode atrair países emergentes  apoiadores ao Brasil que estejam insatisfeitos com as potências centrais. Já a criação de um Estado palestino soberano poderia contribuir para a pacificação do Oriente Médio, pois justificaria a redução da violência por movimentos insurgentes. Porém nem o Estado israelense nem EUA, Europa, Rússia e China demonstram interesse ou comprometimento sólido com a causa, o que mostra que a situação está longe de ser resolvida.

Sobre o conflito entre Brasil e Israel, são aguardados os desdobramentos da reunião entre Lula e o secretário de Estado americano Antony Blinken, realizada a portas fechadas nesta quarta-feira (21\02), em Brasília. Os países já tinham encontro marcado antes da declaração de Lula e Blinken evitou comentar sobre a declaração.