A procissão do Círio tem início às 6h da manhã, na Catedral da Sé, um dos templos mais antigos e icônicos de Belém, com sua construção finalizada em 1748. Esse é o ponto de partida de uma jornada de fé que percorre 3,6 km até a Basílica Santuário de Nazaré, uma imponente construção de estilo neoclássico, que se tornou o destino final da procissão. A basílica, com sua arquitetura rica e sua importância simbólica, recebe a imagem de Nossa Senhora de Nazaré após uma caminhada que dura entre 5 e 6 horas.
O Círio de Nazaré, realizado em Belém do Pará, é uma das maiores manifestações religiosas do mundo. Com uma história que remonta a 1793, quando ocorreu o primeiro Círio, o evento reúne mais de 2 milhões de pessoas e acontece sempre no segundo domingo de outubro. Durante mais de 220 anos, o Círio se consolidou como uma celebração que ultrapassa as fronteiras do religioso, sendo reconhecido como Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade pela UNESCO. Sua relevância histórica, cultural e social faz dele um dos momentos mais aguardados e emocionantes do calendário religioso brasileiro.
Durante essa caminhada, um dos elementos mais marcantes é a corda de 800 metros, que acompanha a multidão de fiéis. A corda representa a união entre os devotos e a santa, e milhares de pessoas se agarram a ela como forma de pagar promessas, agradecer por bênçãos alcançadas ou simplesmente expressar sua devoção. O ritmo da procissão é deliberadamente lento, marcado por paradas para orações e momentos de reflexão, permitindo que os fiéis vivenciem a experiência em toda a sua profundidade emocional.
O Círio de Nazaré, porém, não se restringe à procissão principal de domingo. As celebrações se estendem por 15 dias, envolvendo a cidade inteira em um ciclo de eventos religiosos e culturais. Nesse período, diversas procissões menores, conhecidas como romarias, ocorrem, cada uma com um significado especial. A Trasladação, por exemplo, acontece na véspera do Círio, sendo uma procissão noturna que antecipa a grande celebração do domingo. A Romaria Fluvial também se destaca, levando a devoção às águas do Rio Guamá, onde a imagem de Nossa Senhora é transportada em embarcações enfeitadas, seguidas por uma grande quantidade de barcos menores, criando uma cena visualmente impressionante e cheia de simbolismo.
A protagonista dessas procissões, no entanto, não é a imagem original de Nossa Senhora de Nazaré, que permanece na Basílica após o Círio. Durante os 15 dias de celebração, quem assume o papel principal é a Santa Peregrina, uma réplica da imagem original. A Santa Peregrina percorre as ruas, bairros e rios de Belém, levando a fé e a esperança aos que não puderam participar da grande procissão ou que desejam reafirmar seus votos de devoção.
Além de seu aspecto religioso, o Círio tem um impacto cultural e econômico profundo. A cidade de Belém se transforma durante as festividades, com suas ruas tomadas por fiéis, turistas e comerciantes. As tradições gastronômicas ganham destaque, com pratos típicos como o tacacá, o açaí e a maniçoba sendo amplamente consumidos. O evento também movimenta o turismo e a economia local, com hotéis e restaurantes completamente lotados. O Círio é, portanto, não apenas uma manifestação de fé, mas também uma celebração da cultura paraense e amazônica.
O legado do Círio é marcado por histórias de devoção que atravessam gerações. Famílias inteiras se mobilizam para participar, muitas vezes vindas de outras regiões do Brasil ou do exterior. Essa conexão entre passado, presente e futuro mantém viva a essência do evento e reforça a importância de preservar suas tradições. A cada ano, novas histórias de fé e superação são escritas, e o Círio continua a inspirar aqueles que o vivenciam de perto ou à distância.
Ao descobrir a grandiosidade do Círio de Nazaré, fiquei impressionada com a profundidade dessa tradição. Mesmo sem poder estar presente fisicamente, é impossível não ser tocada pelo significado e pela força dessa celebração. O Círio transcende o tempo e o espaço, conectando fiéis e curiosos através de uma história de fé que já dura mais de dois séculos. Ele é, sem dúvida, uma das expressões mais poderosas da espiritualidade e da cultura do Brasil, e conhecer mais sobre essa manifestação de devoção é mergulhar na alma do povo paraense, que, ano após ano, transforma Belém em um cenário de união, esperança e renovação de votos.