18/09/2024 – 14:43 – Rio de Janeiro
Nesta terça-feira (17/09) aconteceu a plenária “Energia Acessível”, no evento Fórum Popular para Transição Energética Justa, no auditório Auditório Horta Barbosa da Universidade Federal do Rio de Janeiro. A palestra reuniu Graziella Albuquerque, representante do G20 no Brasil e membro da ong Revolusolar, o produtor rural da Associação dos Produtores Rurais e Artesãos da Microbacia do Fojo, Alejandro Amaral, e Dinei Medina, presidente da Cooperativa Percília e Lúcio, da comunidade da Babilônia, no Rio de Janeiro.
Foram discutidos os desafios e expectativas de comunidades urbanas e rurais quanto à universalização do acesso à eletricidade em áreas economicamente desfavorecidas.Apesar das diferentes localidades dos painelistas, a plenária mostrou que campo e cidade se encontram quando o tema é a desigualdade social do Brasil, principalmente energia elétrica.
Durante a conversa, Graziella pontuou que apesar de fontes limpas terem recebido mais aportes financeiros, a conta não se refletiu para pessoas mais pobres. “Em 2023, pela primeira vez os investimentos aplicados em fontes renováveis superaram as fósseis, mas como fazemos para que ela seja de fato justa e inclusiva? Ela está atendendo as demandas da sociedade? Apesar de termos uma matriz elétrica altamente renovável, ainda detemos uma das contas de energia mais caras do mundo”. Segundo ela, mais da metade dos brasileiros comprometem o orçamento familiar com energia. “Ainda existe pobreza energética no Brasil”, afirma.
É o que também diz Alejandro, produtor do Sítio do Café, localizado na zona rural de Guapi, no município de Teresópolis. Ele conta que a luz só chegou ao local após o sítio atender ao requisito de ter, no mínimo, 10 profissionais. “Ficamos 5 anos sem luz, porque só tínhamos 5 produtores. Vivíamos de lamparina ou vela. Não podíamos ter moradia nem nada porque se não tudo estragava.”, recorda.
E mesmo dispondo de uma estrutura já operando no momento, eles enfrentam limitações: “Quando acaba a luz, é 5, 6 dias sem. Também vivemos há dois meses a pior seca de Guapi, o que nos fez perder quase 80% da nossa produção. Está sendo uma luta bem grande deixar claro que somos seres humanos e também necessitamos do serviço.”
Segundo o mapeamento de Eficiência Energética em Favelas, “o padrão de penalização dos mais vulneráveis é observado”. O estudo mostrou que nas 15 favelas pesquisadas, as famílias que se enquadram nas duas menores faixa de renda salariais (até meio salário e entre meio salário e um salário) são as que mais sofrem com falta de luz toda semana ou todo dia. O que demonstra que o acesso a esse serviço tem relação direta com o poder aquisitivo, ou não, da população.
Já quanto às zonas rurais, um estudo do Instituto de Energia e Meio Ambiente (Iema) revelou que em 2021, só na Amazônia, eram 990.103 excluídos elétricos, 3,5% da população local.Usinas solares e seu papel na universalização da energia A descentralização energética também foi parte do debate e defendida por Medina. Segundo ele, a existência de usinas fotovoltaicas sem democratização nas favelas representa um desperdício para o país. “No Brasil, a energia solar só vai ser benéfica quando contemplar as famílias mais pobres. Fora isso, ela vai ser só mais uma na matriz para ficar sendo debatida em universidades [distante das favelas, que mais precisam].”
O Brasil já possui 18 mil usinas solares, ultrapassando 38 GW de capacidade instalada. Entretanto o assunto engatinha nas periferias, que dep endem de iniciativas independentes como as usinas comunitárias instaladas na Babilônia e no Complexo da Maré.
A favela da Babilônia exemplifica o distanciamento em relação às favelas: a comunidade recebeu suas primeiras placas durante a pandemia, atendendo inicialmente 34 famílias, que atualmente já se expandiram para 100 atendidas. Além de contarem com uma geração limpa, os moradores também usufruem de economia na conta de luz, um ponto dramático para o setor elétrico atual que vive exponencial aumento de tarifas.
O diálogo também apontou sobre maior popularização dos direitos do consumidor, como o serviço da Tarifa Social, de se haverem maiores incentivos à formação de mulheres na instalação de energia solar e na relevância da cooperação mútua entre setor e sociedade. Diante das aceleradas mudanças ambientais, o alcance de uma transição eficiente e justa também passa pelo dissolvimento de mazelas sociais, ainda muito concentradas nesses perfis.
Para Graziela o ponto de partida é criar políticas públicas que dêem suporte a iniciativas existentes: “Já existem muitas, com vários benefícios de acesso à energia limpa, geração de emprego e renda, novas oportunidades e modelos de negócio de organização comunitária, mas ainda falta um grande apetite político dentro disso. Temos que fortalecer esses movimentos, ocupando esses espaços e garantindo a participação social”, conclui.