16\05\2024 – 09:56 – Rio de Janeiro
A publicação da Projeto de Lei 528/20, ou a PL dos Combustíveis impôs uma série de medidas visando reduzir emissões de gases poluentes no setor de energia. A proposta tem como objetivo alcançar metas estabelecidas pelo Brasil para a descarbonização do país.
Dentre as propostas está a criação do Programa Nacional do Biometano, iniciativa que define a obrigatoriedade da inserção do combustível no setor de gás natural. De acordo com o PL, a partir de 1º de janeiro de 2026 a presença de biometano deverá ser de 1%. .
O biometano é um derivado do biogás, que, por sua vez, é um combustível resultante de processo da purificação do metano, gás emitido por resíduos em decomposição. O metano se faz presente em rejeitos agropecuários (como a vinhaça e torta de filtro0 ou urbanos, (os lixões). Por esse motivo, o biometano pode ser produzido de forma descentralizada, fator que torna esse combustível economicamente atrativo para o país.
Já o gás natural é encontrado em regiões com materiais fósseis, como petróleo, sendo a fonte de energia menos poluente da categoria. Porém, possui um metano de origem fóssil em sua composição, considerado o segundo maior poluidor do meio ambiente pela Organização Meteorológica Mundial (2021).
O gás natural apresenta grande eficiência e confiabilidade energética em sua queima, tendo variados usos, porém é um recurso limitado na natureza, ou seja,não renovável. A integração entre biometano e gás natural é possível por compartilharem propriedades semelhantes e variadas possibilidades de uso comum: nos transportes, usinas termelétricas, residências, comércios e indústria.
Porém, a imposição dessa integração pode dificultar a ampliação desse mercado dado que, o cenário do gás natural brasileiro é dominado por uma única empresa, a Petrobras. Detentora de mais de 90% do mercado. a empresa será a principal compradora de biometano, por obrigação legal, o que também dará à estatal domínio total sobre a oferta de biometano (Segundo dados da ABPIP – Associação Brasileira dos Produtores Independentes de Petróleo e Gás).
Por outro lado, a produção do biometano renovável (com potencial de ser produzido de forma descentralizada), depende da ampliação e estímulo de uma cadeia de biogás, em especial às empresas do setor de cana de açucar. Atualmente, a produção de biogás do país é liderada pelo setor de saneamento, responsável por 96% da produção. Já o setor agropecuário, que possui 77% de usinas instaladas de biogás no país, produz somente cerca de 5% do seu potencial (Empresa de Pesquisa Energética).
Um obstáculo que de acordo com a pesquisa, pode ser superado, por exemplo diante da criação incentivos à criação de demanda em áreas não atendidas pelos gasodutos e pela viabilização de uso compartilhado de estrutura já existente de gás fóssil, os gasodutos, GNC, GNV, GNL.
Segundo estudo da EPE, usinas de açúcar e etanol tem potenciais similares a aterros sanitários de grandes centros urbanos, possuindo a vantagem de “gerar um biogás com concentrações mais elevadas de metano (CH4), [com mais eficiência energética] e sem siloxanos, clorados ou fluorados, [substâncias essas nocivas ao meio ambiente e equipamentos que os processam] facilitando o atendimento às especificações do biometano.”
Para a ABPIP, a obrigatoriedade da medida se mostra impensada e tem potencial de trazer prejuízos aos consumidores de gás, inclusive ao objetivo de descarbonização da indústria.
Ela pontua que:
- Não se sabe qual a oferta e a demanda de biometano
Não há estudos que embasam o PL quanto ao volume de biometano que será necessário para cumprir as metas de descarbonização previstas (1% a 10% de redução de emissões). Cria-se, dessa forma, uma obrigação de aquisição de biometano sem se saber qual a demanda que está sendo criada, nem se haverá oferta para atendê-la.
- Aumenta o custo para a indústria brasileira.
Hoje, o biometano chega a custar o dobro do gás natural, de acordo com a experiência da indústria. Ainda, para a nova oferta de biometano, é preciso considerar os custos logísticos. Em um cálculo conservador, o custo anual do programa a ser subsidiado pelos consumidores de gás natural será de R$ 680 milhões.
- Falta prazo
Se o intuito é auxiliar o setor a ganhar escala para baratear a produção do insumo, é necessário estabelecer metas específicas, vinculando o cumprimento das metas ao fim do programa.
- Obrigatoriedade desnecessária
A compra obrigatória não é necessária para estimular a produção e o consumo. Consultorias especializadas já apontam o biometano como mais competitivo que o gás natural, considerando a valoração do carbono no mercado regulado. “o mercado de biometano vem evoluindo gradativamente pelo interesse de distribuidoras e consumidores, sem a necessidade de medidas impositivas”
- E o mais contraditório: Não descarbonizará a indústria.
O Certificado de Garantia de Origem de Biometano (CGOB) ao qual o PL se refere não é aceito para fins de cumprimento às metas globais de descarbonização (GHG Protocol).
Contudo, a EPE ressalta que mesmo com a progressiva expansão de alternativas para a descarbonização, é necessário o amadurecimento do setor. “Diversos projetos para geração de energia a partir de fontes de baixo carbono exigem grandes infraestruturas, operação de indústrias de rede e captação de recursos em larga escala em ambientes regulatórios diversos, aspectos que são inerentes da experiência adquirida pela indústria de Óleo e gás”, afirma.