Em relatório publicado em 2024, a Agência Nacional das Águas (ANA), alertou para a diminuição de até 40% na disponibilidade da água já no ano de 2040, o que afetaria, por exemplo, a geração de energia hidroelétrica. O texto aponta as regiões hidrográficas localizadas no Norte, Nordeste e parte do Centro-Oeste como as de maior tendência a sofrer com o problema. Segundo o relatório “isso poderá se intensificar com o passar do tempo e a medida que os níveis de emissão dos gases de efeito estufa aumentem.”
As usinas hidrelétricas (UHE) correspondem à 54,6% da matriz elétrica brasileira e entre as fontes renováveis, são as maiores responsáveis por abastecer o país. A falta de água apresenta um risco para este segmento. Por outro lado, o Brasil apresenta leque variado de fontes alternativas de energia, sendo uma delas, o potencial de desenvolver seu parque de usinas reversíveis (UHER), empreendimentos que permitem o armazenamento de água a partir de bombeamento entre reservatórios.
Estas usinas têm capacidade de bombear água de um nível inferior para um superior, atuando como uma espécie de reserva energética, e, portanto, oferecendo maior segurança hídrica para usinas geradoras.
Segundo artigo Usinas hidrelétricas reversíveis no Brasil e no mundo: aplicação e perspectivas, do engenheiro Alexandre Beluco, as UHER criadas a partir da modificação de centrais hidrelétricas ou reservatórios existentes são uma opção menos nociva ao meio ambiente e segura ao setor elétrico. “A transformação de centrais hidrelétricas ou reservatórios existentes se converte em uma forma simples de adicionar armazenamento à rede, com custos e impactos ambientais inferiores àqueles de uma nova central com reservatório ou uma UHER.” Segundo ele, bastaria que ambos os reservatórios tivessem volumes úteis suficientes.
A pesquisa explica que embora os reservatórios existentes já tenham ocasionado impactos ambientais no passado, são a opção mais próxima de um sistema estável. Pois em função do amadurecimento destes, há maior chance de deterem problemas já mitigados. “Neste contexto, uma UHER [reformada em circuito fechado, que opera independente de rios] dificilmente causaria novos prejuízos ambientais significativos.”
O engenheiro e professor Jerson Kelman, pontua que, apesar das UHERs não serem a solução completa para o desafio das hidrelétricas, servem como o início para encontrar uma. Segundo ele, as UHERs consomem a energia excedente produzida na rede para bombear a água aos reservatórios, o que não as torna o remédio para as UHEs, “porém contrabalanceiam com usinas eólicas e solares [gerando energia a partir dessa mesma água armazenada] quando eólicas e solares param de funcionar. Nesse sentido, a sobrevivência das UHE passa sim pelo desenvolvimento das UHERs.”
Em seu artigo no Brasil Energia, Kelman também conta que o país tem condições técnicas e naturais para desenvolver um parque de usinas reversíveis e que elas são uma alternativa para “matar dois coelhos com uma cajadada,” Segundo ele, a implantação em escala das UHERs, para além de cumprir seu papel principal, também “serviria para turbinar essa água nos momentos em que o SIN necessitasse de uma injeção de potência”, assegurando o fornecimento.
Além disso, Beluco complementa, afirmando que a crescente penetração da geração eólica e solar na matriz energética depende, proporcionalmente, do crescimento de armazenar energia no país: “Até hoje, as UHER são o tipo de projeto mais eficiente para este fim.”
Em seu parque gerador, o Brasil dispõe de 221 usinas hidrelétricas, totalizando 103 milhões de kw de potência. Em oposição à 4 usinas reversíveis, onde uma está desativada e as restantes com limitações de operação. As UHERs Pedreira, Traição e Edgard de Souza, estão localizadas em São Paulo, e a UHER Vigário, no Rio de Janeiro.
Essa diferença entre UHERs e UHEs é explicada em diversos fatores. O primeiro, é que, apesar do Brasil ter sido o pioneiro do mundo a instalar uma turbina reversível, na Usina Elevatória de Pedreira, inaugurada em 1939 no Estado de São Paulo, descartou o conceito a partir da década de 1970 devido á variedade de recursos naturais terem suprido a demanda do país por anos. Além disso, a integração do Sistema Interligado Nacional (SIN), possibilitou a disponibilidade de entrega de energia entre variadas regiões, o que postergou uma mobilização pelo tema.
Em Nota Técnica, a Empresa de Pesquisa Energética (EPE), divulgou que há uma previsão de crescimento do uso de fontes eólicas e fotovoltaica de 30% e em paralelo a isso, uma estagnação das UHE, o que reforça a necessidade futura do sistema de recursos compatíveis com os atributos das UHR. A entidade explicou que “graças à flexibilidade operativa, as UHR podem ter uma ampla faixa de aplicações, com benefícios associados à geração, à transmissão e à distribuição e que sistema poderá necessitar futuramente de recursos compatíveis com esses atributos.”